segunda-feira, 15 de fevereiro de 2016

O que o começo tão promissor de pilotos tão inexperientes significa para a Fórmula 1?

Além do promissor Max Verstappen, a Fórmula 1 tem visto vários pilotos brilharem mesmo chegando à categoria com quase nenhuma experiência.




“A Fórmula 1 sempre foi o ápice, o topo, não apenas em termos de tecnologia, de mídia ou de currículo, mas principalmente de dificuldade. O carro de Fórmula 1 foi, e deveria ser sempre, a máquina que mais exige preparo, esforço e aprendizado daquele que se propõe a pilotá-lo. Para se ter sucesso na Fórmula 1, deveria ser fundamental guiar vários monopostos diferentes, ter uma vasta experiência em situações de corrida, acerto de carro e um mínimo de aprimoramento técnico”



Coluna publicada em 16/04/2015 no site Velocidade


Max Verstappen estreou na Fórmula 1 em 2015. Em três corridas, deixou ótima impressão. Sua precocidade levantou vários questionamentos antes do inicio da temporada, por causa de sua idade e sua falta de experiência. Eu confesso que gostei de acompanhar em vários veículos e em outros locais da internet as dúvidas, ainda na “inter-temporada”, em torno da aposta que a Toro Rosso estava prestes a realizar.

Após 3 corridas, vejo que para muitos as dúvidas estão esclarecidas. Para muitas pessoas os questionamentos são de fato coisas passageiras (para outras eles nem sequer existem), mas como este colunista parece ter vindo ao mundo para questionar, acho que sou um dos poucos para quem, após 3 boas corridas, as atuações de Max Verstappen jogam luz sobre um ponto pouco explorado do automobilismo atual. Para este que vos escreve, a confirmação do talento de Verstappen gera outras dúvidas – quem sabe até mais pertinentes, você leitor julgará – sobre como um piloto que mal completou 50 corridas na carreira já surge como futura estrela das pistas.

Explica-se, antes que se exponha qualquer argumento: questionar o sucesso de Verstappen, que é o que esta coluna fará, não significa questionar o talento de Verstappen. Já aproveito para deixar clara e expressa ao leitor a minha ótima impressão inicial deste menino. Guia com precisão: embora erros sejam naturais, raramente os cometeu até agora – mas ainda há muito caminho pela frente, não nos esqueçamos. Além disso, ele me parece ter uma característica muito interessante, que é um bom controle de carro. Suas ultrapassagens em Xangai foram muito interessantes. Algumas com alto grau de técnica, e em algumas delas uma sensação nítida de um estilo de atacar – tardiamente dentro da curva – diferenciado. O ano de 2015 indica até o momento que, na pior das hipóteses, ele se adaptou muito bem ao carro, à equipe, à Fórmula 1.... E isso na pior das hipóteses! Na melhor delas, é possível dizer que é um talento que ainda poderemos apreciar por longo tempo. Ainda é muito cedo para o julgarmos, positiva ou negativamente, então devemos aguardar um pouco mais. O texto aqui apresentado não é de fato sobre ele.

A intenção do texto é questionar se não há algo minimamente curioso no fato de que um menino de 17 anos, com tão poucas corridas no currículo, assente num carro de Fórmula 1 e não mostre dificuldade de guia-lo. E não se trata de um caso único ou raro.
Perceba caro leitor, que Max Verstappen é apenas um exemplo usado para o questionamento. Eu poderia iniciar a coluna puxando pelo nome de Carlos Sainz, ou de Daniil Kvyat – este último com trajetória semelhante à de Verstappen: muito jovem, ascendeu à Fórmula 1 de uma categoria ainda muito rasa entre as que definimos como “de base” e fez uma temporada que deixou impressão positiva, tão positiva que ela já foi alçado à equipe principal da Red Bull.

Pareceu-me pertinente começar com Verstappen por ser provavelmente o exemplo mais nítido do raciocínio proposto: assustadoramente jovem, com experiência próxima de zero, e já apto a performances que impressionam. Mas o questionamento se dá pelo fato de vários outros pilotos, mesmo sem talento tão apurado, terem chegado à Fórmula 1 e parecem não ter sentido as mesmas dificuldades que, no passado, outros experimentaram quando chegaram ao ápice do automobilismo mundial.

A pergunta que surge, e que é muito difícil de ser respondida por quem está apenas do lado de fora, é: o quanto os carros de Fórmula 1 são difíceis de guiar? Entendam que fazer essa pergunta não significa dizer que são equipamentos fáceis de manusear. Para responder essa pergunta com exatidão, só mesmo alguém que já sentou e guiou aquelas máquinas. E é sempre bom lembrar que estamos falando de um esporte onde 3 décimos de segundo significam uma substancial diferença entre equipes ou pilotos. Mas talvez o melhor questionamento seja comparativo: em relação ao passado, o quanto ficou menos complicada a vida de um piloto de Fórmula 1?

Que me desculpem os discordantes, mas não consigo deixar de refletir sobre o tema ao ver um menino de apenas 17 anos chegar à Fórmula 1 e não sentir falta do aprendizado que uma GP2 ou World Series, por exemplo, oferecem. Mas a idade, mesmo muito tenra, não surpreende mais do que a falta de rodagem desses pilotos. Tornou-se nos últimos anos algo quase corriqueiro um piloto sair de categorias incomparavelmente menos potentes do que a principal delas, com monopostos que estão mais próximos de um kart do que de um carro de Fórmula 1, e ser alçado à categoria máxima.

Por mais que exista o talento, há algo que me causa estranheza no fato de a Fórmula 1 não ser mais o topo de uma montanha difícil de escalar. A Fórmula 1 sempre foi o ápice, o topo, não apenas em termos de tecnologia, de mídia ou de currículo, mas principalmente de dificuldade. O carro de Fórmula 1 foi, e deveria ser sempre, a máquina que mais exige preparo, esforço e aprendizado daquele que se propõe a pilotá-lo. Para se ter sucesso na Fórmula 1, deveria ser fundamental guiar vários monopostos diferentes, ter uma vasta experiência em situações de corrida, acerto de carro e um mínimo de aprimoramento técnico.

A Fórmula 1 não deveria estar ao alcance das crianças. A Fórmula 1 deveria ser o auge de uma longa carreira, o resultado de um longo esforço, deveria ser um prêmio, sim, àqueles que lutaram por ela ou a mereceram depois de vivenciar situações desfavoráveis e dificuldades, e depois de comprovada evolução como piloto de corridas.

Pense com seus botões, leitor, qual foi a última vez que vimos um piloto chegando à Fórmula 1 e sofrendo para conseguir performance? Ou para conseguir “dominar” o equipamento? Yuji Ide, talvez... Mas ele não conta, pois se encontra muito abaixo do nível médio dos pilotos de monopostos. Existiu nos últimos anos alguém para quem possamos apontar o dedo e dizer claramente que sucumbiu ao desafio de um carro de Fórmula 1?

É claro que é sempre bom ter boas novidades na categoria. É sempre interessante ver um piloto chegando e mostrando técnica. Isso causa em nós a expectativa de que o nível de talento do campeonato será elevado. Tudo isso procede, de fato. Mas uma coisa é um piloto chegar à Fórmula 1 tendo passado, por Fórmula Renault, Fórmula 3, mais algum tempo em uma World Series / GP2, ou seja, tendo se preparado amplamente para as diversas dificuldades que terá pela frente. Outra, bem diferente, é um piloto com menos de 50 corridas na carreira não ter dificuldade em guiar um Fórmula 1.

Em qualquer esporte de alto nível, apenas talento não deveria ser suficiente para o sucesso. Em qualquer esporte de alta performance até mesmo o talento precisa ser trabalhado, precisa ser aprimorado, precisar ser desenvolvido. Não parece ser o caso hoje do automobilismo. Isso é algo sobre o qual deveríamos pensar.

As novas regras de pontuação para se obter a superlicença vão impedir que estes “saltos de categorias” aconteçam no futuro, então talvez esta seja a ultima oportunidade de percebermos que a distância do carro de Fórmula 1 para o de Fórmula Renault talvez tenha se tornado curta demais.

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